MINHAS CRÔNICAS

sábado, 21 de abril de 2012

FOLCLORE GOIANO


                No começo do ano de 1938, o escritor e folclorista paulista José A. Teixeira esteve em Goiás a convite do então governador Dr. Pedro Ludovico Teixeira. Seu desiderato era estudar, in loco o folclore goiano, tendo em vista, segundo suas próprias palavras “ser Goiás o estado mais rico em tradições verdadeiramente nacionais, ainda não deturpadas pela onda europeizante do litoral”.

                 Visitou dezesseis localidades, sobressaindo-se, pela riqueza do material coletado, as de Morrinhos, Itaberaí, Jaraguá, Ipameri, Goiandira e Santa Luzia; nestas cidades sua atenção foi centrada, principalmente em três ramos do folclore: cancioneiro, contos, lendas e superstições.

                O resultado final desta sua peregrinação foi a publicação do livro Folclore Goiano, com duas edições, 1940 e 1958, ambas da Cia. Editora Nacional.

                O escritor e folclorista paulista ficou encantado com a figura do cantador de desafios que é a figura central das festas e pagodes do sertão; este é, normalmente, analfabeto ou semianalfabeto, porém possuidor de “poesia esplêndida, com grande expressividade das imagens, além de prodigiosa memória e grande agilidade mental”.

                O autor faz referência a uma noitada em Ipameri, a convite do prefeito Dr. Frota, quando o cantador Adolfo Mariano, de Goiandira, desafiou um soldado do 6º. Batalhão do exército para um desafio acompanhado de viola; a contenda só terminou de madrugada, assim mesmo pela intervenção do Prefeito, pois nenhum dos dois queria se considerar vencido na porfia.

                Foi, no entanto, em Goiandira, graças à solicitude e, principalmente o espírito clarividente do então Prefeito, Cel. Absay Teixeira que ele, realmente, se aproximou de Adolfo Mariano de Jesus, “homem de meia estatura, moreno, magro, pais mineiros, lê e escreve; sempre com sua viola, toda enfeitada de fitas”.

               Este homem sertanejo, cuja fama, apesar da sua modéstia, corria sertão afora; durante sua vida escreveu versos sonoros para a memória popular, dentre estes sobressaem os referentes à coluna Prestes e à revolução de 1930; sua moda fornece dados históricos e reacionais da população sertaneja, ante estes dois acontecimentos; além deste particular enfoque, sua poesia registrou, também, os velhos processos políticos e eleitorais da época e na região onde morava, quando imperavam a fraude e a violência.

                 A coluna Prestes, como registra a história, deixou marcas profundas e quase sempre amargas na memória da população rural por onde passava; por quase dois anos Goiás foi o palco das suas atividades revolucionárias.

                A revolução de 1930, chefiada aqui em Goiás por Dr. Pedro Ludovico Teixeira, mereceu acolhida mais cordial da população, como atestam os versos de inúmeros cantadores, recolhidos pelo folclorista no seu livro que citamos acima. 

                O que Adolfo Mariano tem a dizer, na verdade ecoando o que pensava o caboclo, a respeito da coluna Prestes eram versos hostis ao movimento, uma vez que a contrapropaganda governamental também trabalhava neste sentido, fazendo ecoar negativamente toda a sua movimentação.

               Acompanhem comigo a reação do poeta-cantador frente aos dois acontecimentos.

             

ABC da revolução- coluna Prestes (alguns versos)



Amigu leia estis versu  

I presti bem atenção,

Neli queru dar us dadu 

Da ultima revolução,

Desde u Piris du Riu              

Até u velhu Catalão.



Coluna Siquera Campus

Chegandu naqueli pontu,

Feis logu requisição

Pidindu cincuenta contu;

Numa ocasião de crisi

Achou todu mundu prontu.



Demoraram alguns minutu

I começô a malvadeza,

U Siquêra autorizô

Qui ali fizesse limpeza,

Saquiasse o dinhêro

U restu desse à pobreza.



Zoroastru di Artiaga

Logu tirô uma linha

Fugiu levandu a mudança

Puxada numa carrocinha

I pidindu aos que ficassi

Ninguem dê nuticias minha.





                                     

Moda da Revolução de 1930 (alguns versos)



Desculpi franquezas minhas,

Licença, caro leitor,

Vou rabiscar estas linhas,

Com frases mesquinhas                           

Di mau improvisador



Por aqui foi importante                     

Não vou escrever mentira,

Só achei interessante,                

Pois até mesmo os defunto    

Deram voto em Goiandira.



Temos em nossa fronteira

Trabalhando com proveito,

Sinhor Absay Teixeira

Nosso futuro prefeito,

Vae seguir bôa carreira

Por ser moço e sem defeito                                                                                         .



Aqui em nosso Estado

Quando soubemos da vitória

Todos que tinham votado

Pelo lado dos Caiados

Deram as mãos a palmatória



Viva o governo atual

O território brasileiro

Aliança Liberal

Plano de bravos guerreiro,

No livrou de um grande mal

Libertou de um cativeiro.



Achei prudente, aliás, como fez o autor do livro, manter a grafia das palavras como foram escritas pelo poeta-cantador, para que fique demonstrada a sensibilidade e a intuição poética que emanava do seu âmago, apesar do seu semianalfabetismo

Na região do sul de Minas Gerais onde nasci, tive oportunidade de ouvir nos idos anos de 1950, geralmente ao redor de uma fogueira, duplas de cantadores em desafio; claro que não ficaram, para mim, registros das letras daquelas cantorias, ficou, somente a marca indelével daquele acontecimento que o tempo não apagou.   

             


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